Afaste -se para ver

Ilustração:Yaoyao Ma Van

Para protegermos  nossa casa, construímos muros. Para  protegermos nosso  dinheiro, o aplicamos ou investimos em algo ou alguém que  nos  proporcionará  um retorno  maior  que o inicial. Para  protegermos e  alcançarmos  nossos  sonhos batalhamos, de formas  e variadas. 

Para  protegermos nossos amores criamos métodos curiosos como o ciúmes, no final tudo o que nos é  importante, amado, estimado, querido, objeto do nosso afeto e desejo, conseguimos  de  certa  forma resguardar de modo que  nos dê  a tranquilidade e  segurança  necessária para  estarmos em qualquer lugar sabendo que estará  lá quando  precisarmos.

Porém o que fazemos  quando  temos com algumas  pessoas relações  tóxicas? Como nos resguardamos  daquilo e de quem nos  fere e nos atinge? Como cuidar da  nossa mente  quando algo deixa de  ser  saudável? Quando queremos  e precisamos de espaço, de liberdade para sermos quem somos e como somos, de que  formas nos resguardamos? Que  proteções ativamos? Quais armas  levantamos?

Por  vezes vemos relações sadias  tornarem-se abusivas, vemos relações abusivas  roubarem nossa  calma, alma, paz e  sonhos, vemos nossa  segurança  emocional ser afetada  por  quem deveria nos  aceitar  falha, imperfeita, sem salto ou maquiagem, vemos nossos amores  serem o motivo da nossa ausência  de  sentido, mas  protelamos  nossas ações pensando no que vão  pensar se lutarmos  por  nossa  saúde mental acima de qualquer coisa.

Relações são tão tênues que é  fácil esquecermos onde termina o outro e  começa o nós, se torna  fácil chegar  colocando o pé na  mesa, trocando o canal da tv, abrindo a  geladeira e reclamando da ausência de  algo que gostamos  e julgamos que o outro deva ter  por estarmos ali. 

Relações tão  frágeis e tão  fortes que o cuidado se torna afronta, que o estar ali torna-se ameaça, contra a qual não  agimos  porque estamos nos referindo a  quem nos ama e a  quem amamos. Mas  será o amor  o preço justo para nossa ausência de paz? 

Durante muitos anos, me senti deslocada, sem canto, sem jeito, sem liberdade em uma  casa que eu devia sentir  como minha, mas que  só me  lembrava o quanto eu ainda teria que  caminhar para ter um espaço  onde eu pudesse  me  colocar  falha e  imperfeita e ainda  assim estaria  tudo bem, o que eu sou de verdade. 

As vezes a gente sente que a  distância de alguns passos  é necessária né? Eu sentia isso, era como se  tudo até mesmo meus livros gritassem por  um canto onde  pudéssemos  nos  sentir em um lar. A convivência e os  conflitos existentes nisso, apaga de alguns a diferença entre lar e  casa. Bem como também apaga a diferença entre estar bem e estar  Feliz....

Durante 28 anos, eu me senti deslocada, sem canto, durante 28 anos busquei ressaltar minhas qualidades, para me sentir amada, agora quem sabe quem eu sou e topa o desafio, volta todo santo dia. Isso é amar: ficar mesmo conhecendo o melhor e o pior, hoje que sei que " quem é de verdade sabe  quem é de mentira", hoje eu sei porque casa é diferente de lar. Lar é afeto, aconchego, desentendimento que gera mais crescimento que mágoas, e casa é onde tudo o que é lar acontece. 

Mas só percebi isso quando dei espaço, entre eu e quem amo precisava ter um espaço que não era possível antes. José Saramago  nos ensinou algo preciosíssimo quando disse “É preciso sair da ilha para ver a ilha. Não nos vemos se não saímos de nós.” 

Muitas versões  desta frase já  foi compartilhada, mas  o principio é o mesmo e se mantém belo por isso, é preciso sair de cena, para entender a  cena, é preciso se  ver para se entender, é necessário se mapear para se descobrir, é preciso se reparar de  fora pra dentro para entender o funcionamento, e sim a  briga é feia, e não  vai parecer saudável e primeiro momento. Mas é na sombras que enxergamos a luz, é nós decifrando que a gente se  traduz. Nada escapa do mistério de  se dar tempo e espaço, a  gente  aprende a se  soltar, a respirar e respeitar de novo o outro. 

Tenho reaprendido quem sou e quem  o outro é, a medida que  me afasto e me  permito olhar de novo, com mais alma, calma, paciência e resiliência, tenho descoberto em mim um furacão decido a  buscar o melhor  de cada dia, meu canto enfim se  tornou o lugar que  tanto desejo quando o fim do dia se aproxima, certa vez alguém me disse que não importaria  o quanto houvesse  problemas em minha casa eu só me  sentiria presa quando a  liberdade me mostrasse que ali é pra onde quero voltar, é  o que  disse e volto a  repetir há sempre quem nas nossas  sombras vê a luz, quem sabe tudo e  tudo bem, quem nos vê  frágil, imperfeita, sem máscara ou maquiagem, há quem ama quando nos  conhece. 

E isso me  leva a uma  conclusão! Viver bem, e caminhar na  vida é aguardar momentos e peças  com encaixes que não serão perfeitos, me serão  encaixes, perfeição e a maior estupidez, quando  temos  uma  vida curta com possibilidades extensas, o fato é que  temos  escolhas, ou aproveitamos a estadia  nos cercando de gente que acrescente, que escolha nos escolher, ou nos cercamos de relações efêmeras e vazias, a  vida é um oceano e somos a  embarcação é preciso coragem para se jogar no oceano sem mapa, mas é  um caminho sem volta não  se permitir  dar espaço entre nós é o que nos  fere. Se conhecer, se assumir é impessoal e intransferível, porque não diz respeito do quanto o outro nos afeta, e sim do quanto nos mesmos  seremos  afetados  por  nós conhecermos.

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